As recentes manifestações que ocorreram no país deverão trazer grandes mudanças. A partir de agora, sob pena de serem severamente punidos nas urnas, o Executivo e o Legislativo – em todos os níveis – serão obrigados a redirecionar a forma como vêm atuando. As imensas passeatas começaram como pequenos protestos contra o aumento das passagens de ônibus, em São Paulo. A incorporação de outras demandas populares e a truculência policial, fez com que o numero de participantes no movimento rapidamente aumentasse. Como um rastilho de pólvora, o “clamor das ruas” se estendeu a cidades de todo o país. No dia 21 de junho, segundo estimativas, havia algum tipo de manifestação em pelo menos 150 cidades do país.
Motivos para esta manifestação firme e pacífica do povo evidentemente não faltam. A corrupção e a má gestão dos recursos públicos foram, sem dúvida, os fatores que mais influíram nesta imensa mobilização popular. O movimento só tende a aumentar e tornar-se cada vez mais consciente dos problemas a serem atacados.
A falta de capacidade administrativa do governo, o desperdício dos recursos e a corrupção, são problemas em todos os setores, inclusive no ambiental. O licenciamento de grandes empreendimentos, por exemplo, sempre foi utilizado como um dos principais “bodes expiatórios” do governo e das empresas prestadoras de serviços, alegado como razão para o atraso de obras públicas. O próprio ex-presidente Lula, por diversas vezes culpou o Ministério do Meio Ambiente e o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), pelo atraso na aprovação do licenciamento ambiental das grandes hidrelétricas no Rio Madeira, em Rondônia. Em uma destas ocasiões a então ministra do Meio Ambiente Marina Silva, inconformada com as constantes pressões, pediu demissão do ministério e se desligou do PT, do qual foi uma das fundadoras.
A falta de planejamento por parte dos empreendedores e a ausência de estrutura nos órgãos de controle ambiental, são os principais causadores dos atrasos nas licenças ambientais. O empreendedor requer a licença em um estágio muito avançado do projeto, por vezes com informações incompletas. Apesar disso, no entanto, espera uma rápida aprovação do processo, para que possa iniciar a obra. Por seu lado o órgão ambiental federal ou estadual, sem suficientes especialistas e falta de equipamento, não tem condições de atender a demanda em tempo hábil.
Cria-se então uma situação na qual os governos pressionam os órgãos ambientais, para que estes reduzam suas exigências, a fim de acelerar a aprovação do projeto e o início da obra. Mario Mantovani, diretor da ONG SOS Mata Atlântica, é um dos maiores opositores desta prática. Em recente entrevista ao site Terra, Mantovani criticou a “facilitação” na concessão de licenças ambientais para grandes empreendimentos. “O governo trata as licenças como uma maldição que emperra o desenvolvimento, mas maldição mesmo é um governo que não dá valor para a questão ambiental”, afirma. Além disso, Mantovani cita as fraudes descobertas recentemente no Rio Grande do Sul, visando a agilização de licenças ambientais. “A licença é o único instrumento de controle social das obras, mas hoje está fragilizado”. Assim, também no que se refere à questão da proteção do meio ambiente, o povo tem razões de sobra para ocupar as ruas.
Ricardo Ernesto Rose, jornalista, graduado em filosofia e pós-graduado em gestão ambiental e sociologia. Desde 1992 atua nos setores de meio ambiente e energia na área de marketing de tecnologias. É diretor de meio ambiente da Câmara Brasil-Alemanha e editor do blog “Da natureza e da cultura” (www.danaturezaedacultura.blogspot.com)