in ,

Notas sobre o mercado ambiental brasileiro

Metalurgica

As primeiras indústrias surgiram no Brasil no final do século XIX, com o aparecimento de tecelagens e metalúrgicas. Durante o início do século XX o numero de indústrias cresceu, principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo. Ao final dos anos 1930 o país já possuía um parque industrial capaz de atender as necessidades básicas do mercado consumidor interno. A industrialização inicia-se efetivamente a partir da década de 1950, quando o Brasil já dispunha de uma pequena indústria de base, estruturada de modo a sustentar o crescimento de outros setores. Fortemente impulsionada pela indústria automobilística e seus fornecedores, seguiu-se toda uma cadeia produtiva de metalurgia, produção de máquinas e equipamentos. Aliado a estes setores, ocorre a expansão da infraestrutura (transportes e geração de energia) e a construção das primeiras refinarias, base do desenvolvimento da indústria petroquímica na década seguinte. Ainda durante este período, o governo de Juscelino Kubitschek institui o Plano de Metas, cujos principais objetivos eram: combate ao subdesenvolvimento via industrialização, diversificação da estrutura produtiva, reforma agrária, distribuição de renda, planejamento econômico e reforma administrativa fiscal. Concede-se às multinacionais prazos de isenção fiscal, terrenos, infraestrutura e crédito oficial. Muitas delas se instalam com menos de 20% de investimento efetivo de capitais. Ocorre assim forte fluxo de capitais, sobretudo dos EUA, da Alemanha, do Japão e da França. O PIB (Produto Interno Bruto) cresce em média 7% ao ano, contra 5,2% no período 1945-1955. A produção industrial aumenta 80% em 1955-61, a siderurgia 100%, a indústria mecânica 125%, a elétrica e de comunicações 300% e o recordista setor de transportes cresce 600%.

Setor de Teares

Imagem 5 – Vista do setor de teares em meados da década de 1920 Fonte: Associação dos Amigos e Moradores de Marzagão – ACAMM

 

Paralelamente ao processo de industrialização também sucedem grandes mudanças no campo, a partir da década de 1960. A incorporação de uma maior extensão de terras agricultáveis, através da expansão da fronteira agrícola em estados como Paraná, Goiás e Mato Grosso, provoca uma demanda maior por equipamentos e insumos agrícolas, iniciando o processo de mecanização do campo. Este fato, aliado à grande oferta de empregos nos centros urbanos, fortalece bastante o êxodo rural, que já vinha ocorrendo desde a década de 1940, mas se tornará mais acentuado entre os anos 1950-1980. Neste processo haverá um deslocamento de cerca de 30 milhões de pessoas do campo para as cidades. No início dos anos 1950 aproximadamente 70% da população brasileira ainda vivia no campo e 30% nas cidades. Apenas trinta anos depois, esta proporção havia se invertido. É preciso não subestimar o impacto que estas migrações causaram nas grandes metrópoles brasileiras, já que os investimentos na expansão da infraestrutura não foram suficientes para atender a crescente demanda por serviços públicos, vindo a provocar o colapso da qualidade de vida nas grandes regiões metropolitanas.

Durante este período da história do país, chamado de “milagre econômico”, a questão da degradação ambiental não era discutida. O governo da época, formado por militares e tecnocratas, estava mais interessado em aumentar a produção industrial e na ocupação de terras virgens na região Norte (Transamazônica) e no Centro-Oeste, do que na proteção dos recursos naturais. A falta de preocupação ambiental era compreensível para a época, já que o país tinha que crescer e gerar riqueza para a maior parte de sua população. Em consequência desta orientação, inexistia praticamente uma legislação ambiental, não havia órgãos de controle ambiental e a ação de ONG’s era fortemente cerceada. A opinião pública não tinha acesso a informações e desconhecia a degradação ambiental em andamento – a proteção dos recursos naturais provavelmente não passaria pela cabeça da maior parte dos brasileiros à época.

Aproveitando a completa ausência de controle ambiental, o setor privado – nacional e estrangeiro – também não realizava quaisquer investimentos para atenuar o impacto de suas atividades industriais. O setor público, principalmente governos estaduais e municipais, sempre priorizou o fornecimento de água potável, já que tais investimentos eram imediatamente percebidos pela população, geravam receita e tinham um custo de instalação menor do que o tratamento de esgotos domésticos. Quanto aos resíduos domésticos ou indústrias, não havia legislação específica ou diretrizes técnicas, e desta maneira eram destinados às valas ou “lixões”, construídos de modo primitivo, sem qualquer tipo de proteção do solo.

No final da década de 1970, a situação econômica mundial e do Brasil sofrem uma grande mudança. Os capitais de investimento, ainda fartos no mercado mundial antes da segunda crise do petróleo (1979), tornaram-se escassos. Os países ricos redirecionam seus investimentos, há uma retração geral dos mercados em desenvolvimento e a economia brasileira deixa de crescer nos níveis médios de 5% ao ano, registrados nos 15 anos anteriores (1964-1979). No quadro político interno tem início o processo de redemocratização, que culmina com a votação da Constituição em 1988 e a convocação das eleições presidenciais diretas em 1989.

Com relação ao meio ambiente, em meados da década de 1970 já se esboça um maior controle, através da criação de leis mais específicas e do surgimento dos órgãos de controle ambiental. Esta preocupação, mesmo que ainda incipiente, culmina com a votação de diversos artigos na Constituição, versando especificamente sobre a proteção ao meio ambiente.

A abertura da economia brasileira que tem início no final dos anos 1980 e se amplia a partir de 1990 com o governo Collor, também trouxe benefícios ambientais. As empresas brasileiras tiveram que melhorar sua produtividade para poder enfrentar a concorrência dos produtos importados. O aumento da produtividade também implicava um melhor uso das energias e insumos, reduzindo, desta forma, os resíduos perdidos na produção. Empresas exportadoras também foram pressionadas por seus compradores estrangeiros a implementarem sistemas de produção mais limpos, já que os consumidores dos países ricos preferiam produtos fabricados por processos ambientalmente corretos. Com mais informações disponíveis, os consumidores e a opinião pública brasileira, passaram a exigir melhores produtos e condições de vida, com qualidade ambiental. O número de ONG’s também aumenta rapidamente, atuando em diversos segmentos, desde programas sociais que envolvem iniciativas de reciclagem de materiais, ações populares exigindo o tratamento do esgoto doméstico, até movimentos por moradias e reforma agrária. Os conceitos de “desenvolvimento sustentável” e “tecnologias limpas” – discutidos durante o Encontro Internacional sobre Meio Ambiente realizado no Rio de Janeiro, em 1992 (ECO 92) – passaram a ser gradualmente incorporados às estratégias das grandes empresas brasileiras e estrangeiras e a muitos setores do governo federal.

O mercado ambiental brasileiro é o maior da América Latina. Devido a sua população e extensão territorial, o governo brasileiro precisa fazer grandes investimentos em saneamento e gestão de resíduos, além de outros setores. Até o momento uma grande parte da população – cerca de 45% – ainda não tem esgoto tratado. Na questão dos resíduos domésticos, a maioria dos municípios ainda não dispõe de aterros sanitários corretamente instalados.

A indústria ambiental brasileira surgiu durante os anos de 1950, como resposta a demanda que se iniciava no setor público (prefeituras) e privado, principalmente na área de tratamento de água e efluentes. Os poucos fabricantes de equipamento que existiam no mercado ainda não estavam especializados e forneciam equipamentos para processos industriais, assim como para o tratamento de água e efluentes. A demanda existente no mercado ainda era muito pequena e deste modo não existia a especialização. Equipamentos não disponíveis eram importados ou fabricados por empresas já atuando no setor, dependendo do volume da demanda. O desenvolvimento da indústria ambiental ocorreu em grande parte devido às necessidades específicas cada vez mais crescentes da indústria, apesar de o setor público sempre ter sido o maior comprador de equipamentos neste segmento.

O mercado da indústria de saneamento tomou impulso a partir da década de 1970, quando o governo federal instituiu o PLANASA (Plano Nacional de Saneamento), criando as companhias estaduais de saneamento. Estas companhias receberam as concessões das prefeituras para assumirem os serviços de tratamento de água e de esgoto das cidades. Deste modo, as companhias estaduais de saneamento acabaram por centralizar estes serviços, tornando-se importantes interlocutores para as empresas privadas, fabricantes de equipamentos e consultorias fornecedoras de serviços especializados. Atualmente existem 27 companhias estaduais de saneamento, atendendo cerca de 3.800 municípios. Os 1.700 municípios restantes possuem serviços de tratamento de água e esgotos autônomos.

A demanda do mercado é suprida por fabricantes estabelecidos no Brasil; empresas de capital nacional ou multinacional. Como o mercado de equipamentos de saneamento estava fechado às importações até 1990, desenvolveu-se internamente uma forte base industrial, capaz de suprir a maior parte das demandas de equipamentos e serviços do setor. Existem nichos de mercado, como instrumentação de controle e monitoramento, análise e automatização, que ainda não são supridos pela indústria nacional em sua totalidade. Estas tecnologias são supridas por importações, realizadas através de representantes brasileiros de fabricantes estrangeiros.

O mercado para as tecnologias para gerenciamento de resíduos desenvolveu-se em época posterior ao do das tecnologias de tratamento de água e de efluentes. A maior parte da legislação relacionada com o transporte, manuseio, recuperação e destinação final de resíduos só foi desenvolvida durante a década de 1980. Por outro lado, o transporte e a disposição dos resíduos domésticos são de responsabilidade das prefeituras, que estão em situação deficitária em sua maioria, impossibilitadas de realizarem novos investimentos. Para dar uma destinação correta a seus resíduos, as empresas privadas se utilizam em principalmente da oferta de serviços e equipamentos já existente no mercado nacional. A exemplo do mercado de saneamento, o setor de gerenciamento de resíduos é dominado por empresas brasileiras, principalmente quanto aos equipamentos. Existem algumas empresas de consultoria atuando em associação com empresas estrangeiras, mas sua quantidade ainda é muito diminuta em relação ao potencial do mercado.

O mercado ambiental brasileiro continua em constante evolução. A nova legislação referente ao gerenciamento de resíduos urbanos, a Política Nacional de Resíduos Sólidos está criando novas mudanças no mercado, abrindo novas perspectivas de negócios para as empresas. Igualmente as tecnologias de energias renováveis estão se tornando cada vez mais representativas na matriz energética. O grande impulso, no entanto, virá da melhoria do controle ambiental e de uma maior conscientização por parte da população, exercendo papel fiscalizador sobre as ações do governo.

 

Texto: Ricardo E. Rose
contato@sustentahabilidade.com.br

Outros textos do autor:

Uso e exploração dos oceanos

O que você acha?

Escrito por Ricardo Rose

Ricardo Ernesto Rose, jornalista, graduado em filosofia e pós-graduado em gestão ambiental e sociologia. Desde 1992 atua nos setores de meio ambiente e energia na área de marketing de tecnologias.

Instituto Aua

Ecomercado… uma realidade do Instituto Auá

O Brasil que eu quero

O Brasil que eu quero … Fundação Crescer Criança