Na Europa e Estados Unidos, desde a década de 1980 já é grande a preocupação com a qualidade
da água. Não que a pureza do líquido não atendesse às especificações estabelecidas por normas
sanitárias internacionais, ao contrário. Os consumidores recebem em suas casas água potável da mais
alta qualidade, tanto que em algumas regiões da Alemanha e da França a água da torneira tem a mesma
qualidade da água mineral, comercializada a altos preços em garrafas, nos restaurantes tradicionais.
O que vem preocupando as autoridades sanitárias daquelas regiões é a presença de diversas
substâncias que não podem ser removidas da água pelo tratamento convencional. Análises laboratoriais
constataram que águas de rios, lagos e barragens, aparentemente livres de qualquer contaminação,
continham pequenas quantidades de poluentes provenientes de medicamentos (hormônios, drogas
ilícitas); produtos de beleza; higiene pessoal e limpeza; aditivos para gasolina, entre outros.
No Brasil ainda estamos em um patamar diferente. Damo-nos por satisfeitos quando nossas estações de
tratamento de água (ETAs) conseguem eliminar as substâncias patogênicas e tóxicas mais elementares
que ainda pululam em nossas águas destinadas ao consumo humano. Recebendo efluentes domésticos
e industriais, agrotóxicos e lixo, as águas dos rios que se transformam na água que bebemos precisam
receber um forte tratamento químico, antes de chegarem às nossas torneiras – quanto mais suja a água,
tanto mais caro o processo para purificá-la. Mas, na prática, ainda estamos bastante afastados do nível
de preocupação dos países desenvolvidos, com relação à pureza da água.
Recentemente, no entanto, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) do Ministério do Meio
Ambiente (MMA), apresentou proposta de desenvolvimento de tecnologias para acompanhamento da
qualidade dos rios cujas águas são destinadas ao consumo humano. O objetivo da ação é retirar da
água as nanopartículas que possam causar dano à saúde das pessoas. Esses pequenos resíduos, não
sendo eliminadas com o tratamento convencional, requerem o uso de tecnologias de ultrafiltração e
nanofiltração, por exemplo, capazes de reter moléculas e até vírus. É sabido há tempo que a ingestão de
água contendo estes traços de poluentes, mesmo que em mínimas quantidades, pode levar a doenças
como o câncer, distúrbios metabólicos e endócrinos, mutações no DNA e outras ainda em estudo.
Cogitam os médicos de que a alta taxa de infertilidade feminina e masculina, entre as gerações mais
novas, também pode ter relação com estas substâncias dissolvidas na água. O prejuízo, dizem os
cientistas, não está na quantidade, mas na ingestão prolongada.
No Brasil ainda estamos tecnologicamente atrasados, às voltas com ações visando reduzir a poluição
de recursos hídricos destinados ao consumo humano e tentando diminuir perdas de água tratada
durante o processo de distribuição aos consumidores. No entanto, com a melhoria da infraestrutura de
saneamento, inevitavelmente a micropoluição da água se tornará tema importante. Inúmeros casos de
doenças, cujas causas são atribuídas ao acaso ou ao destino, são efetivamente o resultado da falta do
uso de tecnologias adequadas para tratar ou impedir a poluição da águas.
Ricardo Rose é jornalista, graduado em filosofia, pós-graduado em gestão ambiental e sociologia. Atua
desde 1992 no setor de meio ambiente e energia, na área de marketing de tecnologias. É diretor
de meio ambiente da Câmara Brasil-Alemanha e editor do blog “Da natureza & da cultura”
(www.danaturezaedacultura.blogspot.com).