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De Ray Charles a Kodi Lee

De Ray Charles a Kodi Lee

A história da musica é repleta de exemplos espetaculares de artistas cegos, desde o maravilhoso Ray Charles, passando por Steve Wonder e José Feliciano.
Algumas pessoas nascem com ouvidos apuradíssimos, tecnicamente classificado com ouvido absoluto.
Porém nas suas jornadas pela vida visando alcançarem o status de exímios instrumentistas, são necessárias sessões de exercícios exaustivos por anos a fio, independente do DNA da jovem promessa apresentar o “carimbo” talento musical.
Ou seja, talento no sangue desde o berço, por si só, não resolve.
Paralelamente, pessoas portadoras de deficiência, tendo ou não talento artístico, acabam por desenvolverem outros sentidos “compensatórios” para mitigarem uma limitação física.
Os cegos, por exemplo, ampliam a capacidade auditiva.
E conseguem mais… desenvolvem a memória “fotografando na imaginação” sons e aspectos peculiares ao seu redor, com o objetivo de orientá-los num eventual trajeto até algum destino, pois estão impossibilitados de referências visuais .
Mas, sendo um instrumentista cego e envolto no seu próprio mundo interior (pois o externo de certa forma inexiste), a musica e a arte são suas pontes para este mundo não visível, limitado pela cegueira, portanto “capturando” na memória estes insights.
Logo, para os céticos, quando uma criança, como Ray Charles que adquiriu a doença aos 7 anos de idade, apresenta propriedades musicais extraordinárias, atribuem este fenômeno pela expansão dessas sensibilidades (auditiva e outras), que propulsionam um talento.
Assim sendo, atribuem o desafio da “superação” do indivíduo que aflora capacidades que “dormitavam” dentro do ser.
E é evidente que os exercícios sistêmicos proporcionado pelos pais( mais zelosos nestas circunstâncias) também contribuem para o desenvolvimento destes atributos, nos filhos que apresentam esta “desvantagem” diante do mundo competitivo corriqueiro.
Contudo, no “America’s Got Talent” a improvável apresentação de Kodi Lee, um jovem de 24 anos, AUTISTA e CEGO desde a infância, desafia a lógica.
Pois o autismo é um transtorno neurológico gravíssimo, onde o portador tem o sistema nervoso central afetado, com dificuldade de comunicação e interações social.
Sendo também cego, Kodi Lee, não teria como “fotografar“ o conhecimento musical, mesmo que exposto exaustivamente a este aprendizado.
Ate porque não há como impor treinamentos repetitivos a um autista, pois o “select “ da vontade pertence exclusivamente ao indivíduo, inviabilizando qualquer capacitação técnica de alta performance, no esporte, arte etc.
Até mesmo a “resposta” nervosa é comprometida, tanto que Kodi como qualquer pessoa nestas condições, balança o corpo desordenadamente, mesmo quando se mantém em pé numa posição de repouso.
Mas ao sentar-se ao piano, Kodi adquire outra expressão.
Se agiganta nos segundos que antecedem a apresentação.
A sensação de equilíbrio se apodera do ser, que passa apresentar outra postura física.
O olhar perdido se transforma, e até a incapacidade de falar as coisas mais simples, sucumbi diante de um vozerio majestoso de um cantor perfeito e tecnicamente imbatível, que surge do nada.
É como se a alma de Kodi se desmenbrace em 2 partes, saindo o ”kodi criança” que os pais colocam para dormir, e surge um homem adulto, portador de uma aura exclusivamente artística, que momentaneamente assume a “gestão” daquele momento.
Terminada a última nota… o último timbre… retorna a criança
que mal sabe falar, e que balbucia as vezes coisas incompreensíveis, que são “traduzidas” pela mãe ao público atônito, que se emociona, porque não compreende…
Ou porque compreende e portanto se emocionam?
Seria muito adequado para a nossas almas que buscam entender o Universo ao nosso redor, entender que a jornada de Kodi Lee, filho de imigrantes sul coreanos, não tenha se iniciado em 07 de julho de 1996 em Utah –EUA, quando nasceu e embrenhou-se através do Planeta Terra.
Afinal, sendo também portador da doença de Addison, distúrbio onde as glândulas adrenais produzem quantidades insuficientes do hormônio cortisol e aldosterona, Kodi sofre com as cosequências da fadiga, náuseas, e tontura após se levantar.
Todas estas peculiaridades de Kodi, ganham relevância com um humor potencialmente pouco confiável, dada as questões hormonais desordenadas, que chegaram a protelar o início da apresentação no “America’s Got Talent”.
Pois, o que a audiência assistiu está editado, onde os minutos de tensão e de exposição indevida do artista foram excluídas, por respeito ao cidadão Kodi Lee.
Afinal Kodi manteve-se “travado” por bons minutos, a ponto do jurado Simon Cowell, propusesse à mãe do artista, para que voltassem ao palco no final do programa, eliminando uma “pressão” desnecessária… e claro, para que a gravação pudesse seguir com os demais artistas que aguardavam.
Mas performance de Kodi Lee, na canção “Song for You” famosa na versão espetacular de Ray Charles, se mostrou um desafio minúsculo para o vencedor do “ America’s Got Talent” .
Por que?
Claramente Kodi carrega algo maior que uma genética adequada à musica, sendo portador de uma experiência Universal muito além dos seus quase 26 anos vividos com síndrome de down.
Caminhar até o piano, isto sim, deve ter sido um esforço hercúleo para um corpo relutante em fazer algo que os “outros” querem, pois o corpo reage instintivamente aos parâmetros que o limitam.
Mas sentar e tocar, claramente se mostrou algo facílimo, pois a alma de Kodi que deslizou pelo teclado daquele belíssimo piano Steinway, estava sintonizada a um momento artístico perfeito, para quem sabe fazer aquilo como ninguém.
Portanto cabe a pergunta neste encerramento: como estariam nossas almas, diante das respectivas caminhadas pela vida?
Relutantes diante da verdade, como os passos pesados e imperfeitos de Kodi que seus pés inseguros demonstravam quando se dirigia ao piano?
Ou exalando leveza e sonoridade como as mãos hábeis do artista perfeito, que deslizaram suaves notas musicais pelo piano?


Texto: Roberto Mangraviti


www.robertomangraviti.com.br
Colunista da ADASP-Associação dos 

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Escrito por Roberto Mangraviti

Economista e Facility Manager em Sustentabilidade. Editor, diretor e apresentador do Programa Sustentahabilidade pela WEBTV. Palestrante, Moderador de Seminários Internacionais de Eficiência Energética, Consultor da ADASP- Associação dos Distribuidores e Atacadistas do Estado de São Paulo e colunista do site do Instituto de Engenharia de São Paulo.

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